O Sínodo Pan-Amazônico, prestes a ser celebrado em Roma (de 06 a 27 de outubro de 2019), está no foco de muitas contestações internas e externas ao convívio eclesial. Todo o alvoroço questionador ao referido Sínodo, por sua vez, serviu para fazê-lo mais visível e, por conseguinte, mais importante. O objetivo deste texto é justamente fazer uma análise de algumas críticas, sobretudo de setores de dentro da própria Igreja Católica, ao Instrumento de Trabalho do Sínodo Pan-Amazônico.
Não são poucos os veículos de comunicação que espalham notícias sobre o Sínodo aqui referido. Mas há muitas Fake News veiculadas sobre o mesmo evento e sabe-se que os mais adeptos a estas más informações são setores ultra conservadores que se posicionam claramente contra o Papa Francisco e seu magistério por considerá-lo demasiado progressista.
Acusam o Instrumento de Trabalho do Sínodo de ser herético. Acusação infundada. Mas é bom que se diga que o Instrumento de Trabalho (instrumentum laboris) é um ponto de partida e não de chegada. Ele não é já o documento final do Sínodo e, ao que se sabe, o Sínodo não tem poder decisório, pois é consultivo. Todas as decisões são reservadas ao Santo Padre que, encerrado o Sínodo, lançará uma exortação pós-sinodal. É também importante esclarecer que como texto propositivo, o Instrumento de Trabalho pode ser revisto. Quando do Concílio Vaticano II, por exemplo, o “Esquema XIII”, que deu origem à Gaudium et Spes (Alegria e Esperança), passou por exaustivas revisões e foi o último documento do Concílio a ser aprovado. Por isso, mais calma ao polemizar sobre o Instrumento de Trabalho do Sínodo.
Agora vamos a algumas considerações sobre questionamentos ao Instrumento de Trabalho do Sínodo:
- Acusam o Instrumento de propor uma doutrina panteísta. Panteísmo é a ideia segundo a qual a natureza é deus. O Documento, a partir de uma concepção ecológica integral, aponta para a presença de Deus em toda a criação e não diz que a criação seja deus ou coisa do tipo. Portanto, esta acusação é leviana.
- Acusam o referido Instrumento de Trabalho também de causar confusão ao propor a ordenação de homens casados. Até onde se sabe o celibato sacerdotal não é um dogma de fé e pode sim ser revisto pelo Santo Padre. Já há padres casados na Igreja, na sua parte oriental, mas também na Igreja Latina. Sim, na Igreja Latina! Em 2009 o Papa Bento XVI acolheu padres Anglicanos já casados e estes foram ordenados padres Católicos e continuaram com suas famílias. Nenhuma polêmica à época levantou-se, pelo contrário. Sabe-se que este tipo de decisão é sempre diante de situações bem específicas, como é o caso da realidade Amazônica, onde os padres vão às comunidades raramente e não permanecem muito tempo com elas. Desta constatação vem uma pergunta: a rejeição é ao Sínodo mesmo?
- Outra acusação ao Instrumento de Trabalho do Sínodo é no que diz respeito à discussão do papel da mulher nas comunidades amazônicas. Numa sociedade em que a mulher ganha cada vez mais espaços de decisão, por que não também no seio de nossas comunidades? Não se clama no Instrumento de Trabalho, como em outros momentos da História da Igreja, pela ordenação de sacerdotisas, mas pelo reconhecimento e abertura de espaços às mulheres. Sobre o sacerdócio feminino o Papa João Paulo II já encerrou a questão. O Papa Francisco reiterou também esta posição. Agora, ao olhar nossas comunidades, para além da Amazônia, quem mais ocupa os bancos de nossos templos? Mulheres. Elas são a maioria da Igreja ativa e praticante. Que mal há em dar-lhes mais espaços em Conselhos Pastorais e Administrativos, em coordenações de comunidades, em ministérios extraordinários da palavra, da eucaristia, do batismo, em faculdades e demais órgãos eclesiásticos? O Papa Francisco tem feito esforços de confiar cargos importantes a mulheres em organismos da Santa Sé antes só governados por homens, dando uma demonstração clara de que o exemplo começa de cima.
Deste modo, embora de modo limitado, chegamos a uma constatação: com o olhar sereno e atento aos sinais dos tempos devemos dar graças pela celebração do Sínodo Pan-Amazônico. Jamais deveremos perder de vista o apelo de Jesus: “que todos sejam um” (Jo 17,21), pois é em unidade que temos que buscar permanecer.
Por Padre Rubens Chaves, Tribunal Eclesiástico Arquidiocese de Teresina