DESPEDIDA DE DOM JACINTO FURTADO DE BRITO SOBRINHO
13 de FEVEREIRO de 2023
Excelentíssimo e Reverendíssimo Senhor Administrador Apostólico Dom Jacinto Furtado de Brito Sobrinho, na pessoa de quem cumprimento os demais irmãos e irmãs aqui presentes, Graça, Saúde e Paz!
Há dez anos o senhor chegava entre nós não como forasteiro, mas por sua condição de cristão chegava como um irmão que iria presidir os demais na unidade da fé, por Vontade Divina e mercê da Sé Apostólica. Desde então, tornou-se nosso bispo, aquele que por vocação nos assistiria do alto e nos impulsionaria a lançar as redes em águas mais profundas (Lc 5,5). Naquele dia festivo, o do inicio de seu ministério episcopal entre nós, num almoço oferecido ao senhor e aos seus convivas eu lhe falei em nome do nosso presbitério que era desejo nosso segurar-lhe os seus braços em sua faina episcopal assim como fizeram Aarão e Hur com Moisés na batalha contra Amelec (Ex 17, 12). Se conseguimos, foi por Graça Divina, se não, pedimos sinceras desculpas, já que a vida do presbítero deve ser vista sempre a partir daquele que pela fé, tornou-se nosso bispo e que por missão deve fazer com que a chama do Dom de Deus seja reavivado em toda a Igreja Particular que lhe fora confiada (2Tm 1, 6).
Pois bem, passados estes anos quanta coisa a ser lembrada e, quanta coisa a agradecer ao Dono da Seara! São tantas que certamente não conseguirei abarcar nestas parcas linhas. Para fazer-me compreender o espírito de gratidão e memória que toca nossa Arquidiocese neste dia poderia tomar como modelo tantos heróis de nossa fé como Santa Dulce, Santa Teresinha, os servos de Deus Pe. Cícero e Pe. Pedro Balzzi ou quiçá os frades alemães sob o hábito dos quais o senhor cresceu na sua amada Bacabal. Todavia, para realçar este espírito vou ao Panteão da França que se encontra em Paris contíguo a Igreja de Santa Genoveva patrona daquele povo que resistiu, inclusive, a fúria dos revolucionários franceses e de lá trazer a figura do escritor francês Victor Hugo. O porquê de usar alguém que disse em morte acreditar em Deus e não um de nossos irmãos e irmãs que seguem com suas vestes brancas e palmas nas mãos rumo à contemplação do Cordeiro? (Ap 7, 9-16); por dois motivos: o primeiro um estudo recente sobre este escritor francês e o segundo o fato de ter ele escrito, dentre tantos, um livro que ganhou proporções impensadas para o século 19 e que chegou a nós a partir do título na versão em inglês: O Corcunda de Notre- Dame. Sobre este livro daqui a algumas linhas revelarei a improvável conexão entre o bacabalense Jacinto e o francês Victor Hugo.
A Igreja Piauiense-Teresinense teve a graça de contar com bispos e arcebispos que a seu modo e segundo o espírito de sua época souberam engendrar nestas plagas e em sua gente o Dom da fé católica. Não me debruçarei sobre o legado destes prelados, por questão didática, convido a voltarmos nosso olhar e atenção para Dom Jacinto. O que relatarei agora não será apresentado de modo cronológico. Estou pondo neste memorial o que me salta à mente e, por isto mesmo, poderei esquecer algo ou ser impreciso em outras, mas garanto que a intenção é a melhor de todas. “O que a memória ama fica eterno”, já nos diz a poetisa mineira de Divinópolis, Adélia Prado.
Desde sua chegada até os dias de hoje Dom Jacinto o senhor se preocupou em se revelar um verdadeiro arquivista, que o diga seu caderno dos trabalhos legionários de sua adolescência que se mostrou intacto no memorial de seu jubileu de ouro sacerdotal. Dom Jacinto veio para Teresina com seu senso de praticidade e soube como ninguém, quase um monge, a conciliar oração e ação. Ele dignificou a residência episcopal fazendo uma necessária e urgente reforma em toda sua estrutura. Dotou aquela residência de tudo aquilo que é necessário para se acolher o metropolita teresinense e preservando nossa história e patrimônio. Neste compasso reformou o prédio de nossa Cúria Metropolitana, estimulou a reforma das casas de nossas paróquias e em alguns casos até construiu confiando sempre na Divina Providência, e nunca teve receio de estender as mãos e pedir ajuda. Também orientou o cuidado com nossos espaços litúrgicos tornando-os cada vez mais de acordo com o que o Mistério Celebrado exige.
Estimulou as vocações em nossa Arquidiocese fazendo-nos entender que não somos eternos e que precisamos promover os nossos irmãos e sucessores, as vocações existem, é preciso provocar e elas virão em abundância e qualidade. Para estimular a propulsão das vocações e a manutenção das mesmas organizou o projeto Terra Sacerdotal. Neste horizonte, e revelando nosso compromisso com a causa vocacional, o Conselho Presbiteral como presente oferecido pelo jubileu de Ouro Sacerdotal de Dom Jacinto concordou que a partir de janeiro de 2022 as nossas paróquias, áreas pastorais e diaconias passariam a enviar de suas entradas um percentual que ajudaria na manutenção das vocações em nossa Arquidocese, além das tantas manifestações da Providência de Deus para este bem tão inestimável para nossa Igreja, que é a formação dos futuros pastores do Povo de Deus.
O senhor arcebispo acreditou no Diacônio de nossa Arquidiocese tornando os diáconos aquilo que realmente eles são, membros deste rico presbitério arquidiocesano. Desenvolveu e executou, não obstante dificuldades, as Diaconias Territoriais e Setoriais em nossa Igreja Particular. Seguiu, como dizia Santa Teresa de Ávila, com determinada determinação a inspiração divina posta no coração de nosso amado Santo Padre o Papa Francisco, o desejo de uma Igreja em Saída. Dom Jacinto nos levou para as periferias de nossa Arquidiocese e ainda nos surpreende quando repete o que dizia São Francisco de Assis: “Irmãos comecemos, pois até agora pouco ou nada fizemos”.
Recolheu numa ação sem precedentes a história de nossa Igreja Piauiense com a Coleção Sucessores dos Apóstolos em Teresina. Reestruturou o Arquivo Arquidiocesano e fez, seguramente, com que a Chancelaria de nossa Arquidiocese trabalhasse mais do que nunca. Deu-nos o Guia Arquidiocesano de Teresina uma verdadeira fotografia da face de nossa Igreja Particular.
Junto ao laicato organizou os movimentos para assistir as pensões e os hospitais presentes em nossa cidade de Teresina. Cuidou e ainda persiste no cuidado com o mundo universitário, criou a Associação dos Médicos Católicos, formou e instituiu inúmeros Ministros Extraordinários da Palavra e revelou que seu coração está enfronhado no espírito que guiou o Concílio Vaticano II, mostrando assim, que ele não tem medo de lutar contra o clericalismo que pode nos tocar a nós ministros ordenados e que pode atingir também alguns não poucos fieis cristãos leigos e leigas. Promoveu o amor e o conhecimento a Sagrada Escritura nos enriquecendo com as Irmãs e Irmãos da Comunidade Nova Jerusalém, estimulando as Semanas Bíblicas, ofereceu-nos o Mês com Maria, dirigiu-nos inumeráveis cartas e circulares revelando-se um verdadeiro escriba. Instituiu o “Ressuscita com Cristo”, fazendo-nos ir da Cruz à Ressurreição com o Mestre Jesus e, para melhor compreensão e participação no Mistério celebrado, fez com que em todo o território de nossa Arquidiocese tivéssemos acesso a Eucaristia nas Sagradas Espécies do Pão e do Vinho.
Confesso que mais coisas estão vindo à minha memória. Terei que colocar um freio nas mesmas, pois, imagino que os senhores e senhoras ainda estão a se perguntar onde que entra a conexão do radicado pedreirense com o filho de Bensançon na França?
É de Dom Jacinto a expressão de que nossa Arquidiocese respira com dois pulmões. O primeiro é o Santuário de Santa Cruz que logo que ele conheceu aquele chão sagrado passou a amá-lo e a se preocupar com ele. Junto com seu reitor e a equipe de padres que ali servem começou a embelezar aquele ambiente místico e a torná-lo cada vez mais acessível e cômodo. Abençoou a Campanha dos Devotos da Santa Cruz e estimulou para que ali houvesse um lugar digno para os devotos e para os sacerdotes, diáconos e religiosos que ali prestam seu serviço ao povo fiel do Senhor. No nosso Santuário estamos certamente mais próximos da Terra Santa.
O outro pulmão é justamente o elo que nos liga a Victor Hugo, nascido em 26 de fevereiro de 1802 e morto em 22 de maio de 1855. Em sua obra Notre-Dame de Paris de março de 1831, dentre outros, há quatro personagens que chamo a atenção: o arcebispo Claudde Frollo, o sineiro Quasímodo, a musa cigana Esmeralda e o guarda real Febo. Frollo e Quasímodo são o alter ego de Victor Hugo, o guarda real Febo representa a Paris de então que não dava o devido valor a jóia gótica da França que é Notre-Dame representada com seus encantos e sedução na Musa Esmeralda. Justamente neste enredo romântico-medieval vimos o romancista francês dizer a Paris e a França cuidem de Notre-Dame.
Olhemos agora para nossa Catedral, Notre-Dame des Douleurs, vejamos como “exalam em vossas vestes perfume de mirra, aloés e incenso; do palácio de marfim os sons das liras vos deleitam. Filhas de reis formam cortejo; se posta à vossa direita a rainha, ornada de ouro de Ofir (Sl 44, 9-10). Nunca nos esqueçamos meus queridos que aqui hoje nos fazemos presentes, não foi Victor Hugo quem nos convocou a cuidar desta Casa de Adoração de Deus posta aos cuidados de Nossa Mãe das Dores. Foi um também radicado crateuense que, por obediência se fez filho do Sol do Equador e que amou “Teresa, eternizada Teresina”, ao ponto de firmar aqui sua tenda para viver a graça de sua emeritude. Para tornar ainda mais bela nossa Notre-Dame da Chapada do Corisco no dia 24 de maio deste referido ano será inaugurado o carrilhão de nossa Igreja Mãe. Um sonho que Dom Jacinto acalenta há muitos anos. A partir daquela data ao ouvirmos os sinos dobrando ou repicando nos lembraremos não de Frollo ou Quasímodo, mas do amado Jacinto. Obrigado querido Dom, será necessário uma eternidade para expressar nossa gratidão. Entretanto, aqui finalizo, não queremos que apenas nós nos lembremos do senhor, é desejo nosso que também o senhor se lembre de nós e, por isso, gostaríamos como Arquidiocese de oferecer este anel como sinal de sua espopnsalidade para com esta Igreja – Esposa sem manchas e nem rugas. Deus te abençoe querido bispo e que o senhor tenha uma longa e feliz vida entre nós. Aqui além de nosso amor e cuidado não lhe faltarão o seu chocolate na Páscoa e nem seu Panetone no Natal. Com carinho e afeto profundo de sua Arquidiocese. Deus muito lhe pague.
Pe. Fábio Carvalho Fernandes
Representante do Clero