Não é de hoje certa estranheza das pessoas quando, no dia seguinte ao Domingo da Ressurreição, ainda lhes saúdo com um caloroso “Feliz Páscoa!”. Pior ainda se houver passado duas ou três semanas desde o Grande Domingo. Na verdade, é uma pena que ainda não tenhamos descoberto no Mistério Pascal a sua força própria, a sua importância capital e, mais que isso, o modo como ele orienta toda a existência cristã.
Para quem crê no Ressuscitado, o mesmo que prometeu permanecer conosco todos os dias até o fim dos tempos (cf. Mt 28, 20), não deveria parecer estranho proclamar qualquer dia que fosse a sua Páscoa. Não se trata de mais um milagre histórico, uma ocorrência surpreendente que, depois do sepulcro vazio, voltou a ser sepultada. O mistério pascal de Cristo, sua paixão, morte e ressurreição, cume de toda a obra redentora, é um acontecimento superior a qualquer outro. E sendo que fora o próprio Verbo de Deus encarnado que o realizou perfeitamente, tem um valor eterno que ecoa no tempo e além dele com frutos para o passado, o presente e o futuro da condição humana.
Se o pensarmos como um pequeno luzeiro aceso em um ponto da história, o Mistério Pascal é como a fração de segundo que ilumina explosivamente todo o curso da existência humana, e cuja luz incandesce tudo antes e depois daquele ponto original; de maneira que a linha do tempo não passa agora do fio condutor desta força incandescente. A isto chamamos o tempo grávido de eternidade. O sentido da vida não está senão em transcender os simples acontecimentos com uma postura que é a decisão pelo agora de valor eterno. Melhor dizendo, o hoje de Deus. Hoje, agora mesmo, faço triunfar a vida, a alegria e a esperança.
A luz pascal acende-se, então, nos corações que não deixam vencer o desânimo e a morte, mesmo se provados pelas adversidades. Cristo, vencedor do pecado e do seu salário mortal, estende a todos os homens e mulheres pela participação em nossa carne o poder da sua vitória. Não há quem esteja privado deste dom. Porque aderir a ele, acolhê-lo na vida não requer uma inteligência especial nem alguma riqueza perecível. Falamos de uma graça totalmente outra, como Totalmente Outro é Deus. Nem ouro nem prata, mas o nome de Jesus (cf. At 3,6). Nem a ciência arrogante nem o excesso da profecia e da fé, mas a suma caridade (cf. 1Cor 13,2).
Como seria bom viver a Páscoa de cada dia! Reacender com a beleza dessa verdade os círios apagados pela violência e pela incredulidade dos homens. Um olhar menos burocrático perceberia que mesmo a criação dá testemunho da vida nova cuja perfeitíssima imagem é o Senhor Ressuscitado. Em cada amanhecer, quando o astro maior nasce, anuncia que foi abatida a sombra da noite. Finalmente o sono pode dar lugar a um despertar revigorado. No campo, a semente lançada deve morrer para não ficar só, germina e produz cem por um. Ressuscitado, Jesus é o grão de trigo, que moído gera o pão da vida. É também o Sol da Justiça, que a todos resgatou da sombra da morte.
Para onde olharmos haverá sempre um sinal de ressurreição. Muitas vezes ainda por ser descoberto. Somos, por isso, convidados a uma existência pascal, que nos obriga a viver conforme as coisas do alto (cf. Cl 3,1), membros vivos do corpo místico de Cristo. Nele somos como que enxertados no tempo de Deus, participamos do presente ininterrupto do seu amor. A morte, de modo algum será a última palavra. Para o cristão, no diálogo da fé, há sempre nova perspectiva. Em suma, para Deus e para os que o encontram, é sempre Páscoa, passagem, vida que brota da morte na ressurreição. O agora de Deus é o seu amor.
Igor Torres Almeida – Seminarista da Arquidiocese de Teresina