Nas últimas décadas deste século temos acompanhado o rápido crescimento das tecnologias e dos meios de comunicação social e com eles vemos ampliar o campo do conhecimento e das descobertas científicas. Vemos propagar-se também uma ideia de que a fé e a Igreja estão “atrasadas” e são contrapostas ao avanço do conhecimento, colocando assim um embate entre fé e razão.
No meio acadêmico, lugar propício para a reflexão, debate de ideias e crescimento intelectual é comum a ideia de que a Igreja é um entrave à razão e que as pessoas que tem fé precisam se abrir à luz do conhecimento e se libertar das amarras da Igreja. Constantemente se observa muitos cristãos sendo atacados nesse meio, é uma espécie de perseguição branda, ela não se dá por meio de armas ou de violência física, mas pressiona para que abandonem seu credo. Um filme recente chamado “Deus não está morto” mostrou com clareza essa realidade que circunda as universidades.
Diante dessa questão podemos nos perguntar a respeito da relação entre fé e razão e nos questionar: seria a filosofia grega e o conhecimento contrários a fé cristã? Seria a Igreja contrária ao conhecimento? Nesse sentido o próprio Jesus nos dá um esclarecimento quando nos fala de como deve ser nosso relacionamento com Deus; Ele nos diz “Amarás o Senhor, teu Deus, de todo teu coração, de toda tua alma e de todo teu entendimento” ( Mt 22,37), vemos assim que o próprio Jesus nos pede um amor que busque dar-se também através do conhecimento, ou seja, uma fé que busca entender o seu próprio sentido através da reflexão e da capacidade que Deus nos deu de pensar.
Desde o princípio do Cristianismo vimos grandes esforços de se fazer uma ponte entre fé e razão; com a expansão da fé cristã pelo Império Romano, a necessidade de transmitir e compreender melhor o mistério revelado fez com que muitos Padres da Igreja estudassem a filosofia, não é por acaso que ela encontra-se também hoje como base da formação sacerdotal. Já no século segundo a literatura cristã ganha nova forma “o caráter de demonstração científica, em forma apologética. Número notável de gentios, dotados de sólida formação intelectual, entraram na Igreja” (Altaner, 2004, p. 69). Filosofia e reflexão teológica tornam-se a partir daí companheiras inseparáveis.
Antes de ser um empecilho à fé, a filosofia mostra que é mais ainda um auxílio na reflexão, pois “variados são os recursos que o homem possui para progredir no conhecimento da verdade (…). De entre eles sobressai a filosofia, cujo contributo específico é colocar a questão do sentido da vida” (FR n. 3). Os primeiros bispos e teólogos como o grande Santo Agostinho modelaram à partir da fé e do conhecimento filosófico o pensamento ocidental. A respeito dessa relação o Papa São João Paulo II nos diz “A fé e a razão (…) constituem como que as duas asas pelas quais o espírito humano se eleva para a contemplação da verdade” (FR n. 1)
Se observarmos atentamente veremos que a filosofia serviu de base desde o início do cristianismo para melhor compreensão da fé cristã, pois a Igreja “considera a filosofia uma ajuda indispensável para aprofundar a compreensão da fé e comunicar a verdade do Evangelho a quantos não a conhecem ainda” (FR n. 5). Mesmo a compreensão de muitos dogmas usa-se de certas categorias filosóficas, como por exemplo, a ideia de pessoa enquanto individualidade de vontade e ação próprias na base da diferenciação das três pessoas da Trindade. Sem esquecermos que os sistemas filosóficos de um modo geral exerceram grande influência no modo de pensar dos teólogos, que os refletiam no modo de entender a fé e exerciam influência direta na catequese das pessoas e em seu modo de agir cotidiano.
Por fim, olhando para a história podemos ver que fé e razão juntas foram capazes de construir o edifício sólido da nossa civilização, possibilitando vida e esperança às pessoas, ambas têm uma característica comum: fazem o homem sair de si mesmo e o lança para frente com um olhar esperançoso para o futuro. Por isso podemos sem medo ver na razão um auxílio necessário para o crescimento da fé e que ambas antes de serem contrárias, são talvez duas faces de uma única moeda chamada Verdade.
James de Sousa Amaral
Seminarista da diocese de Paraíba